Por que temos medo do silêncio
Sempre fui ligado no 220. Estava sempre em atividade e fazendo parte daquela turma que fala, como se fosse algo enaltecedor, que está na correria. Hoje tenho preguiça dessa palavra. Quem diria que um dia eu desligaria o som ambiente de minha casa, e as vezes até colocar o celular no modo avião para desfrutar de plena paz?
Isso é silêncio para mim, um momento de plena paz. Ao ler isso, você pode estar concordando, mas a verdade é que, em prática, e para a maioria das pessoas, silêncio é sinal de medo, solidão e vazio. E eu cheguei a conclusão que essa definição não está errada. Questão de como o mental de cada um interpreta as coisas.
Silêncio representa o medo, por que na busca humana por atenção, aceitação e saciedade, o silêncio virou algo raro, portanto desconhecido, e consequentemente o desconhecido causa medo.
Silêncio representa solidão, e embora não exista nada de errado nisso, infelizmente a maioria das pessoas não suporta a própria companhia e precisa de terceiros para se sentir amada.
Silêncio representa vazio, mas esse vazio é justamente para ser preenchido com a conexão interior que o silêncio nos proporciona. Assim, podemos melhorar nossa relação conosco, observar e aprender com os erros e situações repetitivas que vivemos ao longo da vida e que aceitamos passivamente devido a estarmos sempre inquietos, vivendo no piloto automático.
Silêncio é a forma mais simples de meditar. Todo mundo adora dizer que começou ou vai entrar na meditação. Está na moda e se esquecem que para meditar você necessariamente não precisa ter uma hora marcada, botar uma roupa fitness e fazer “oooohmm”. Se esquecem que meditar não é um compromisso, uma meta em que você está ali presente em corpo físico, mas com a cabeça pensando no que vai fazer assim que acabar o horário da meditação.
É essa inquietude que dificulta tanto apreciarmos o silêncio. O maior estímulo da inquietude é o celular, depois nossa boca. Como as pessoas falam, não é mesmo?
E foi assim que conheci o silêncio de verdade, quase por acaso. Fui ficando cansado daquela competição pela vez de falar nas rodas sociais e corporativas, ao passo que percebia também que a história de um pouco importava para o outro. E lá estava eu, modéstia a parte um ótimo ouvinte, dedicando tempo e atenção as pessoas que quase sem respirar recitavam Camões a respeito de seus problemas, dramas e sonhos. Quando chegava minha vez, a primeira brecha era aproveitada para ela voltar ao centro das atenções, pois ela também já tinha vivido algo parecido e precisava verbalizar como vivenciou tal fato. Passei do saco-cheio a introspecção, e da introspecção para a reclusão.
Fiquei um bom tempo assim, até involuntariamente fechando portas para quem buscava se aproximar. Fato é que essa reclusão me fazia bem, pois minha alma pedia paz, pedia silêncio, pedia minha própria atenção. Me apaixonei pelo silêncio e consequentemente por mim mesmo.
O que você pode aprender com tudo isso e trazer como rehab para seu dia-dia?
Quando você abraça o silêncio, você cessa aquele desespero de se auto-afirmar e achar respostas prontas para seus problemas perante a sociedade. Então, consigo mesmo, você não precisa mentir. É o famoso “aceita que dói menos”. Nem tudo são flores no começo, mas ao se conectar com você e se aceitar, você observa e adquire o aprendizado de vivências do dia-dia, cortando o mal pela raiz.
Você passa a se colocar mais como prioridade e desprender seu tempo para o que realmente importa, sendo mais assertivo e franco em seus relacionamentos pessoais e suas decisões na vida.
Você passa a valorizar o que o outro tem a falar e aprende muito com aquela projeção de você na qual a pessoa se expressa. Ouvir deixa de ser uma competição ou um fardo e se torna uma grande escola da vida.
Você passa a dar valor a pequenas e simples coisas como ficar sozinho relembrando e sendo grato por bons momentos da vida.
Você deixa de sair de casa por pressão de amigos e da necessidade das fotos para o Instagram naquele dia que tudo que você quer é ficar em casa sem querer fazer nada.
Por fim, silêncio é um passaporte para a espiritualidade, mas aí, isso é assunto para outros tópicos.
Se você tem medo de silêncio, tem medo de si próprio. Que tal se reconectar e fazer as pazes consigo?
Boa sorte.